segunda-feira, 30 de outubro de 2017

Tosco

Teimo em repetir palavras e erradicar acentos por descaso ou revolta com o padrão normativo do dizer. Teimo em repetir: não sois mais e nem quereis ser. Ser mais implica em fazer melhor sempre que puder e o vosso talento é a mediocridade. Melhor não, pensa o patético boneco ventríloquo. Farei o suficiente que puder e nada mais. Ocasionalmente menos, mas nunca mais. As ideias que te moldam não são de progresso, mas também não sucumbem ao mal. O que será que é o mal? Se aprendemos a matar, matamos. Se aprendemos a roubar, roubamos. Se não aprendemos a melhorar, caímos e continuamos fingindo estar de pé.

sábado, 15 de julho de 2017

Compostura.

Comecei a vida fazendo, mas meu sonho er'escrever.  Arrisquei a sorte nos contos, errei e desisti. Comecei a escrever eventos, detalhes e acréscimos, entalhes de revista e lacunas de jornal, cansei. Cantei a nova bossa na manhã serena, aplaudiram e choraram sem querer, viram que eu podia oferecer alguma coisa nova além do MPB. Mas se eu falhar, o que há de vir a ser nessa pintura? Perco a pose e a compostura só de pensar, mas aí eu vou pedir. Vou chorar com meu pedir, mas vou pedir. Jamais vou desistir, mas e se for? É direito meu ser vendedor de flor numa cidade que proíbe poesia. É de encargo meu a nostalgia pr'essa burguesia triste e sem sal. E mesmo salgada a vida, engulo a verdade compriiida que me obriga a desandar. E pra ajudar a vencer a fadiga, eu compro bebida pra sala de estar. Agora eu vou poder cantar até o sol raiar, mas não mais que isso. Me enterro no colchão de pedra e torço pra não levantar. A exceção me dita a regra e logo eu volto pro lugar. Vou trabalhar, vou trabalhar, vou trabalhar.

quinta-feira, 13 de julho de 2017

Espelhos.

Tenho-me em muitos lapsos e em memórias de histórias que me contam sobre mim. Aliás, foi em uma dessas minhas desventuras que eu perdi meus sapatos, atordoado pela ketamina e ludibriado pelo não-contar das horas, por que não? Na época me recordo de estar fugindo da noção espacial e convencional do tempo — em segundos, minutos, dias, etc. — e recordo-me de ter conseguido chegar a me perder nos meses. Não era delirante, senão em seu âmbito acadêmico, uma pesquisa que visava justamente a desinformação. Raras foram as vezes em que voltei a passar tanto tempo sem olhar para manchetes de jornais e sem saber o que acontecia ao meu redor. Mas foi nessa época que eu percebi que não fazia a menor diferença. Fora os entorpecimentos usuais, passava bastante tempo em casa, à deriva social. Levei a sério o experimento. Pedi para os meus companheiros de bar que me contassem apenas o que fosse estritamente necessário para a minha vivência, salvo calamidades públicas de ordem superior. Meu cotidiano não mudou e eu não me senti mais deslocado do que nos lugares aos quais eu me realoco. O tempo livre, por ouro lado, esticou-se. Sem que eu precisasse desgastar-me aprendendo sobre um universo que, com ou sem mim, permanecia em processo lento — imperceptível, eu diria — de transformação, minha barba crescia e apara-la tornou-se um hábito agradável. Eu pude dar atenção total a mim, à minha aparência e ao meu psicológico agora que o tempo não me convinha. Fui ficando mais bonito, acredito eu, mas pode ser ilusão da minha cabeça. No geral, comi melhor, me exercitei mais e me entorpeci menos. Ainda assim, mais do que o suficiente.
Quando voltei ao presente, haviam passado-se cinco meses e meio. Nada mau. Alguns relacionamentos próximos haviam sido deixados pra lá, outros nem mesmo me vieram à memória senão muito depois da minha recobrada de medida. Percebi que, bem ou mal, estamos mais sozinhos do que pensamos e apenas fazemos o suficiente para fugir dessa realidade pouco tragável. Não estamos assim por obrigação, por assim dizer: gostamos de estar. Duvida? Pois lhe dou o exemplo dos ônibus, onde sentamos cuidadosamente distantes um do outro para evitar um contato maior com alguém "que, até onde sei, pode ser um maníaco ou coisa pior". A verdade é que precisamos de espaço. Preservamos lugares relativamente arejados, embora passemos a maior parte da vida em cubículos. Mas gostamos dos cubículos também, talvez justamente por essa mesma causa.
É engraçado o que se percebe quando se olha pro lado contrário ao da percepção: não existe lado contrário. Em todo lugar, a todo momento, existe algo novo a ser descoberto ou transformado. Hoje escrevo sob um diferente ângulo à respeito da imortalidade: a considero sábia, porém perigosa. Ontem era só perigosa e amanhã poderá ser alguma coisa a mais. Ou a menos, por que não? Para todos os efeitos, porém, é preciso fazer duas considerações. A primeira é um tanto óbvia, mas ainda de suma importância: o homem faz o relógio, não o contrário. A última, que a realidade é uma amiga da qual nenhum de nós deve perder total contato por muito tempo.
Duvida?

Roma.

Como encontrar resposta para o sentimento? Quando vem, chega rasgando por dentro, incontrolável e imprevisível: como uma rachadura no gélido raciocínio. Amar e sofrer partem do mesmo princípio: metamorfosear. São opostos da mesma prima causa, eu suponho. Apenas posso supor, nada me é tangível desse ângulo. Sinto frio, mas não vem da pele. Sinto solidão mesmo próximo aos meus mais queridos entes e sinto fadiga em plena saúde física. E irônico que, depois de todas as conclusões e teorias, minhas palavras extinguam-se por um instinto que me é além-lógico, resumidas sempre em quatro inexoráveis letras. Pergunto-me, no auge do meu delírio, se esse borbulhar me torna mais ou menos animalesco. Afinal de contas, não sei o rumo da evolução humana. Por maior que seja a minha capacidade de pensamento, meu ínfimo conhecimento à respeito do que antecede a minha existência nunca me será suficiente sem um relance do que seria a eternidade. Sendo assim, é impossível determinar se estou dando um passo pra frente ou dois pra trás — segundo minha definição de impossibilidade.
Do jeito que vejo lá fora, não sobreviveremos por muito tempo. É uma pena, entretanto, que todas as minhas considerações até hoje tenham sido vazias ante à complexidade do amor. Sem ele, temo que, ao final de meus humildes dias, terei sido resumido a alguns gigabytes de memória num imenso oceano de palavras esquecidas. Minha real essência será sucumbida à incompreensão e nem mesmo terei tido o luxo de saber se minha inconsistência possui, de fato, alguma consistência em inconsistir. Isso se, claro, considerarmos que existe qualquer diferença que seja entre os loucos e os incompreendidos.
Por essa razão talvez que, a meu ver, o inentendimento me é mais desesperador que o oblivion. Afinal, lembrar-me futuramente não me deixará menos morto — futuramente. É irresponsabilidade ignorar que de nada vos será útil a lembrança da minha carne, salvo por uma possível proeminência desse meu já protuberante ego — que se esvairá antes mesmo dos meus órgãos e tecidos. Em suma, quem eu sou nem mesmo representa o que eu escrevo, uma vez que minha mente é apenas um tradutor das circunstâncias às quais eu fui submetido até aqui.
A ideia que é propagada, por outro lado, independe do seu primigesto uma vez que é absorvida parcial ou integralmente por seus futuros hospedeiros. Isso significa dizer que, uma vez que eu fosse decifrado, a vida do meu raciocínio não mais estaria atrelada à minha própria e se elevaria à condição de imortalidade momentânea. Mas nada disso acontecerá — ou não terá valor senão semântico — se não for considerado o sentir na minha pele ante o quadro de palavras. De nada terá valido a pena o meu doer.
Essas, claro, são apenas considerações. Ninguém é capaz de prever o futuro e, caso possível fosse, duvido que seria eu — visto o meu total desjeito com o presente atual. Sorrio enquanto me enredo nesse labirinto lógico. Delírio é uma boa palavra ante à inconstância tamborilante no meu peito. Bem-me-quer, mal-me-quero?

quarta-feira, 21 de junho de 2017

O Rei. (parte 1)

Eu estou tentando dormir, mas não consigo tirar essa ideia da minha cabeça. Não foi por isso que eu comecei a escrever afinal de contas? Enquanto o resto dorme, cá estamos nós. Eu e você, você e eu - ligados por uma teia invisível de probabilidades que nos levaram a esses dois momentos específicos. O primeiro, sobre o qual escrevo minhas palavras, eu imortalizo para que cheguemos enfim ao teu: a leitura da obra final. Mas não vá se entusiasmando, anônimo leitor, pois esta história não tem final. Até onde eu vejo, inclusive, mal possui início e, dificilmente, dada a conjectura atual, será capaz de possuir um clímax. Ou será que este já chegou? Nesse caso, a história antecipou-se à pena.
Explico-lhe:
Existe, é claro, o momento da escrita, mas também há aqueles anteriores ao ato: uma inquietação, uma lágrima, uma ideia. Existe razão por cada palavra e por cada ato humano, caro leitor, e só neles tal razão é cabível de existir. Dadas minhas palavras, pode-se eliminar, desde já, a possibilidade de uma consciência maior controlando minha voz, pois Esta não está aqui. Lhe digo mais: em toda a minha existência, jamais pude ve-la manifestando-se de qualquer forma que fosse, salvo pelo único momento em que eu próprio me senti divino. Não é proibido se sentir divino, sabia? Nem mesmo prejudicial, acho eu. Acredito que podemos ter pequenos acessos de loucura se forem controlados. Já o descontrole, porém, é o maior perigo do homem. Não a ganância, a guerra ou a malevolência - a existência desta última ainda não está comprovada do meu ponto de vista - mas o descompasso e o exagero. Querer sempre foi demasiadamente humano, por que não? Segundo a filosofia budista, querer é apenas uma sensação carnal, pois o espírito em si não deseja. Eu discordo. Desejar é também amar, também sentir e também sofrer. Se não há querer, nada existe por nenhum porquê existir. Obviamente a ausência de vontade nos tornaria menos impulsivos e inconsequentes, mas também faria-nos apáticos. Querer é, portanto, natural e produtivo: contanto que um não queira demais.
Bom, tendo esclarecido isso, eu deveria começar a escrever. Ainda assim, temo que poucos de vocês me entenderão e, aos poucos que puderem talvez me compreender, peço perdão pela incoerência: por vezes utilizarei-me da parcialidade que me cabe como testemunha, mesmo sabendo que tal inadequação como narrador poderia dificultar a visão do leitor sobre os fatos - afinal, já vimos isso acontecer em Dom Casmurro - mas quais são eles?
Quais são os fatos?
Veja bem, esta tem sido a minha dificuldade em contar uma história. Se digo-lhes meu ponto de vista, tendo à parcialidade, mas se procuro relatar de forma imparcial, mais parcial eu posso ser sem nem mesmo perceber. Pense comigo: colocar-se como onisciente é o primeiro da lista de grandes erros cometidos por grandes homens e eu aparentemente sou um desses homens. Afinal, nenhum ser humano em sã consciência se disporia a ler-me até esse ponto se considerasse minha escrita medíocre. Você deve estar bem atento agora e dizer-se "este homem está confundindo-se com seu eu lírico, ele está louco!". Acontece, caro leitor, que um homem é feito pelas suas ações e não pelos seus pensamentos. Tudo que você pensa e não faz morre com seu corpo. Mas nem tudo que você faz sem pensar terá o mesmo destino. Compreende? Dessa forma, minha grandiosidade na escrita é também minha grandiosidade pessoal, embora meu total conteúdo não se resuma a ela. Esses mesmos grandes homens que mencionamos não foram lembrados pelos seus pensamentos, intenções e angústias. Foram lembrados por seus ATOS, querido espectador.
Por outro lado, são esses mesmos atos que os destroem.
Claro que, para uma mente menos atenta do que a dos meus leitores habituais, muita coisa pode não fazer sentido. Afinal, nem todos possuem tempo de sobra para questionar a temporalidade da ética e a inexorabilidade da natureza humana, nem todos vêem além do bem e do mal. Estudiosos costumam dizer que a história se repete, mas por vezes falham em entender os porquês das próprias frases. Desse jeito, como podem ser chamados de estudiosos pra começo de conversa? Eu não sei, mas chamam-se uns aos outros assim e eu apenas uso por falta de palavra mais simples que os descreva em toda sua ignorância e falsa superioridade. Os dizeres populares ficam gravados como verdades palpáveis em seus cérebros e daí surgem colunas e castelos de ideias, que formam-se a partir de uma simples dúvida que foi posta junto às certezas. É como o câncer. Qualquer aluno de segundo grau deve saber do que eu estou falando, não é mesmo? Vocês todos estudam tão bem a reprodução das células, com todas aquelas palavras que somem da cabeça depois de um ou dois anos, que não teriam como não saber. Se você ainda está nessa fase da vida, peço que não se culpe, nosso sistema de ensino é patético. Somos moldados em verdades absolutas quando o mundo inteiro é, na verdade, apenas o nosso ponto de vista construído sobre esse mundo, com diversas dúvidas sendo falsamente solucionadas e colocadas na pilha de certezas até que não restem mais dúvidas e toda aquela juventude tenha se transformado em ego e câncer. Se não se vê a diferença entre um estudante de doutorado e uma pré-adolescente se deparando com as primeiras noções de lógica, em que mundo vocês estão? Quando foi que todos vocês se esqueceram de que são crianças? Que sociedade estúpida!
Aqui estou eu, com tanto a aprender e cercado de prisioneiros. Onde foram parar os espíritos livres que já deveriam ter acompanhado o processo? O que se fez dos reais pensadores atuais, que nasceriam para suceder as gerações passadas?
Chega. Novamente, todo esse parágrafo vira apenas uma demonstração de ego, uma igualdade de raciocínio pífio. Vê? Nem mesmo eu, com todas as minhas convicções lógicas, consigo escapar da certeza. Esta não deve pensar em existir ou você começará a pensar que pode opinar qualquer coisa sobre mim quando você está aqui para ler.
Perdoe-me pela interrupção, meus dedos não conseguem acompanhar meu cérebro. O fato é que, de fato, nada posso afirmar senão o que vi e vivi. Foram contadas mentiras sobre mim, mas como dizer se a mentira pra mim não é, pros que a disseram, a mais absoluta verdade? Mas aí eu não estarei contando a história do início como eu prometi que faria. Acontece, caro leitor e amigo, que nem mesmo eu sei quem deu início aos boatos. Uma pitada de medo e incompreensão implementada com o veneno das más bocas e eu já era o vilão. Aos treze, aos dezoito ou aos vinte e cinco, nunca fez nenhuma diferença. É vontade encontrar um culpado, embora digam-se tão pensantes. Queria poder chacoalhar cada um de nós e dizer que errar com quem erra é também errar - se me permite o termo. Queria poder contar minha história sem denunciar meu carrasco ou denuncia-lo tendo certeza de que não estaria me tornando como ele ao executar sua sentença.
Mas eu vou contar minha história, caro leitor.
Espere pra ver.

quinta-feira, 15 de junho de 2017

Marie.

Gosto de ver o vento e sentir o ar nas minhas bochechas. Gélidos ares fazem meu rosto esquentar e corar pois estou fugindo das gélidas luzes de ensino. Gosto de sentir a grama nos meus pés descalços e de me deitar pra observar o céu azul não artificial. Quando eu era criança, minha mãe me proibiu de deitar na grama porque grudava toda na minha saia plissada azul.
Sinto falta da minha saia plissada azul.
Eu não ligo muito, pois não estou em nenhum quarto fechado. Não preciso saber se eu sou bonita porque não tenho espelhos e nem saberia o que fazer se eu por acasso encontrasse algum. Às vezes sinto falta de uma pessoa que eu encontrei em uma caixa, mas ela não queria sair da caixa.
"Por que você não sai da caixa?", eu perguntei.
Pessoas não apreciam coisas simples. Semana passada eu peguei carrapato em uma parte secreta do meu corpo porque nadei nua no lago que tem aqui perto. Acho que o Julio, filho pequeno do vizinho, estava me olhando no arbusto. Não liguei. Situações diferentes acontecem quando menos se espera e eu nunca estou esperando nada.
Esses dias eu sonhei com uma pessoa só e foi maravilhoso.
Tudo está bem aqui. Ainda não encontrei uma forma de escrever o que estou pensando, mas um dia o farei. Tem a ver com flores.

Uníssono.

Não escrever é muito mais do que não querer escrever. Eu gostaria de estar criando, mas não possuo capacidade para tal; seja por entorpecimento ou frustração, meu corpo não obedece minha imposição e despedaça como Troia. Sou invadido por um calor que preenche meu corpo em um suspiro, mas não tem pra onde explodir e morre ali. A criatividade apodrece dentro de mim e tudo que eu posso fazer é observar por um aquário. É engraçado, é como se as portas que eu antes dominava ao expressar-me tivessem sido agora tomadas pelo medo do julgamento. Me vejo como homem que virou besouro, como um eletrodoméstico obsoleto que foi deixado, sem maiores motivos, no meio da sala - sem nunca efetivamente ser jogado fora. Minhas paixões da carne conflituam com meus mais profundos e puros desejos, mas me acalmam diante à frustração. Não me curvo à ideia de que o sucesso seja causado por persistência e não pela capacidade, mas não sei de nada e agora já estou velho, essa é a verdade. Aos poucos eu me torno medíocre na carne e na literatura. Na escrita, as várias vozes que aqui falavam calam-se. Quando voltam, chegam devagar e logo vão embora. O pouco do dizer que fica teima a dizer, em uníssono: "eu não sou mais suficiente... me perdoem."
Mas sou incapaz de perdoar.

quarta-feira, 14 de junho de 2017

Dualidade ou dualismo?

É estranho como o raciocínio funciona independente da minha permissão. De tempos em tempos, percebo a colocação de termos como "na minha opinião", ou "acredito eu", mas são apenas floreios para lembrar-me que não sou dono da verdade universal - que é, até onde posso dizer, uma das minhas maiores certezas.
O fim também é uma delas, mas não penso nele. Deveria, talvez então, faze-lo com o objetivo de assimilar que as minhas verdades também terão seu tão esperado fim. O que seria, porém, de mim? Eu e meu enorme ego, o que eu sou sem ele? No mundo idealista, tudo eu seria. Na prática, por outro lado, seria um atraso. É aí que eu devo definir minhas prioridades nessa encruzilhada mental: desejo ser mais consciente do que já sou ou ter maiores chances de sucesso na minha vida profissional e situação econômica? É nisso que se baseia toda dualidade que eu já enfrentei: não no bem e no mal, mas na aceitação da perversão como meio para um outro tipo de crescimento. Em um caminho, eu corro maiores riscos de morrer pobre e indiferente aos olhos da humanidade. No outro, tendo a me converter à perversão do capitalismo selvagem. De um lado, minhas possibilidades de ajudar o mundo são limitadas pela humildade. Do outro, pela minha própria vontade de ajudar o mundo, que possivelmente se submeterá à ganância e ao egocentrismo. Vejo hoje que a suposta maldade é bem mais efetiva do que a nobreza. A perversão é um vício, a benevolência é um sacrifício. A real pergunta é: estaria eu disposto a percorrer um tortuoso caminho até o esquecimento para ser fiel às minhas ideologias? Serão elas mais sólidas do que o gosto por tudo que me for imoral e proibido?
Melhor ainda! Será a perversidade perecível ao relance da consciência? Será o altruísmo perecível à corrupção?

domingo, 21 de maio de 2017

sem título e sem gosto

Sinto-me feliz em um universo de delinquentes. Talvez minha crise seja exatamente por não ser miseravelmente revoltado ou inconsolavelmente deprimido, eu gosto daqui. Nesse lugar, eu sou livre para ser quem eu desejo ser. Sou perfeitamente apto à racionalidade e ao equilíbrio, mas escolho o rumo das minhas ações baseado no meu humor diário. É engraçado perceber que, num universo onde não existe opção correta, eu deixo que a vontade guie o meu ser. Nada me governa. Caminho sobre as rachaduras, rio do caos e fumo um cigarro. Sempre eu e o meu cigarro. Mulheres vão, vem, e eu aqui com meu cigarro. A toxicidade como conheço é o que faz vibrar o eco cotidiano, é o que devora a condição: faço o que não quero para ver-me livre diante do querer. Quando não desejo, deixo-me levar e olho pro céu entorpecido. Acho que o mais adequado seria dizer que eu vivo um sonho, que guio aos poucos e com dificuldade pra não perder o controle. Numa bela manhã de domingo, meus noventa anos terão se passado e eu finalmente acordarei na minha cama de verdade, pra minha vida de verdade. Tudo terá se passado em uma fração de segundo e eu estarei pronto para viver meu dia, terminar minhas tarefas e dormir para sonhar de novo. Mas talvez não. Talvez minha existência não passe de um conjunto de aleatoriedades trágicas, mas o resultado final é o mesmo: vivo pra morrer com a sensação de ter vivido.

terça-feira, 16 de maio de 2017

Bla bla fuck capitalism.

Darkness
This ancient idea following every single one of my steps, dragging me down while I'm towards the light. Ignorance, individualism, despair.
"Unfortunatelly I'm not availabe right now, leave me nothing."
This is the face of evil staring right at your pale cheeks and pale eyes.
What the fuck am I doing to my life?
I find myself in a dead body waiting for decomposition. The partially voted rules (voted by the most ignorant individuals that human kind could have ever seen) can't cure our social wounds and the system seems to be imploding.
No, I'm not talking about the future. I'm talking about the past.
Well, it has to be the past for you since one must write first for others to read what he has wrote.

segunda-feira, 17 de abril de 2017

Secreto.

E esse ciúme proibido que fere, mas não pronuncia? Ele cala e, ao calar, se alastra – como um fungo em ambiente fechado. Arranha por dentro pra mostrar que quer, de todo jeito, libertar-se na boca e no peito e devorar todo e qualquer duvidar. E podem dizer que o amor dói, mas o amor calado rasga e devora por dentro. Como praga, devasta silenciosa – silêncio esse que vibra e quase toca a língua. A vontade de falar fere de tanta míngua e, quando vai ver, é como se o rosto gritasse o que os olhos tentam esconder: "eu quero poder-te viver". Mas se te vivo, tudo estraga: fica o delírio e o resto se apaga. Quanto de ti já saiu do meu lado? Quanto de mim se perdeu no passado?

domingo, 12 de março de 2017

Preciso ir.

Eu perdi a vontade de escrever. Acho que eu deixei secar junto com o choro, que foi abafado pelos gritos da multidão enraivecida. Será que as bruxas se sentiram assim ante à fogueira? Será que existe alguma delas do outro lado pra me receber? Sei que não existe, mas, mesmo em meu leito, minha mente tende à fuga através da esperança. Meu peito bate mais forte e eu digo a mim mesmo que existe solução: quando eu me for, eles vão. Quando souberem, soluçarão como crocodilos velhos e talvez até aprendam alguma coisa. Talvez minha morte seja, para a platéia, mais inspiradora do que as minhas incessantes tentativas de oferecer a outra face. Aí vem-me outro pensamento: culpa. Talvez não seja minha responsabilidade, mas culpa eu tenho. Devia ter reagido enquanto era tempo e me declarado, antes de tudo, louco. Afinal, já que a verdade não funciona, é preferível ser louco a objeto. Me desumanizaram e eu deixei: culpa. Me maltrataram e eu implorei perdão: patético. Mas eu também não escolhi bem meus irmãos, que me amaram apenas enquanto convinha. Apesar desses tantos, má pessoa eu não fui. Alguns imprevistos aconteceram – considero essa carta um deles, por exemplo, pois já devia ter-me ido – mas não tive uma vida de todo mal. Diverti-me, é o que importa. É engraçado pensar que, se nada de mim for desvendado, eu só vou sair como o mal perdedor que sou. É verdade: não aceitei, por um segundo apenas, te-la perdido tão cedo. Talvez inclusive não seja por eles – e sim por ela – essa minha viagem de última hora. Nesse caso, eu peço um favor, caro leitor: se perguntarem por que parti, não diga "por mágoa".
Diga "por saudade".

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Texto

Estamos no começo do século 21, mas não parece século algum. De alguma forma, quase ninguém pensa sobre o que está fazendo, é tudo muito rápido o tempo todo. Essa semana lançou um novo Iphone e novas dez trending topics no twitter, não dá pra acompanhar tudo. Mais do que antes, acredito, temos hoje noção da nossa ignorância. As crianças, aos dez anos de idade, já sabem mexer mais no celular do que nós, adultos, que, aos poucos vamos ficando pra trás. Mas o que fizemos, afinal de contas, para melhorar? Será que reavaliamos nossas ideias como deveríamos e conseguimos mudar nossos julgamentos antes de sermos levados pela maré do cotidiano? Estamos cansados sim, lutamos pelas nossas próprias causas. Ganhamos algumas, perdemos todo o resto. Não somos muito bons, não fomos muito marcantes, talvez? Somos aqueles que viveram dois séculos afinal de contas, não deveria existir algo que nos marcasse pra história? Não tivemos nenhuma Guerra Mundial, mas também não tivemos nenhum grande profeta. Acostumamo-nos a pensar menos, a fazer menos, a aceitar mais. Será que todos os outros antes de nós foram assim? O que deveríamos estar fazendo de diferente? Fomos ensinados e ensinamos de volta o que não se podia fazer, mas o que não se pode mais fazer hoje em dia? Como agir se de repente o mundo diz “esquerda” quando ha cinco minutos atrás dizia “siga reto”? Imagino eu que não seja nossa culpa, também, que os mares estejam poluídos com o nosso lixo, que o ar esteja poluído com os nossos carros, que os nossos pulmões estejam poluídos com o nosso Marlboro vermelho. Fomos colocados no mundo cedo demais, eu diria – caso a própria frase também pudesse ter algum sentido de lamentação por si própria. A verdade é que tivemos a chance, poderíamos ter mudado. Olhando bem, poderíamos ter feito muita coisa e “amado ao próximo.” Terminamos relacionamentos, não é mesmo? Inclusive eu posso ter terminado com alguém que um dia estiver-me lendo, então aproveito a ocasião pra perguntar: por que deixamos de nos falar? Fomos crianças também como eles, mas por que nunca termos tido a coragem de encarar o outro e dizer “Ei, como vai você? Éramos bem loucos, não é mesmo?”. Acho que a culpa também não é nossa por isso, fomos ensinados a esquecer porque era mais fácil. Acho que essa é a palavra, é por ela que estamos todos aqui vendo as crianças cometerem os mesmos erros que nós cometemos com a televisão à cores. Não temos coragem de olha-los nos olhos e dize-los “Eu errei e isso dói, eu não quero que você seja eu. Por favor me ouça.” porque isso seria admitir o problema e talvez precisar concerta-lo. Mas como encarar um problema que você tem ignorado pelos últimos vinte anos e esperar que ele seja mais fácil de resolver do que na época em que você desistiu dele? Eu não sei, mas preciso de uma resposta.
Talvez escrever ajude nisso. É o que o meu psicólogo me diz, mas ele tem grandes chances de ser um adulto estúpido igual ao resto de nós. Espero que, na faculdade de humanas, eles pelo menos tenham fritado mais seus cérebros com LSD e anfetaminas pra descobrirem algumas das coisas que nós não tivemos coragem de tentar. Talvez aí o mundo tenha jeito. Meu psicólogo fala que toda geração tem o mesmo problema e brinca que isso é um dos porquês de existirem psicólogos. Eu rio com ele, mas não acho graça. Afinal de contas, eu estou pagando pra resolver um problema que eu não queria precisar encarar, mas encaro. Aí ele me receita “remédios pra alma”, como meditação e leituras leves.

Eu acho que o pessoal de humanas fritou mesmo seus cérebros.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Utopia.

Que dor redescobrir você na infantilidade minha. Te achei jogada, entre papéis, discreta e sozinha, esperando o fim. Tuas palavras não me foram suficientemente vagas para que eu pudesse lê-las sem doer e, teus perfumes, embora um dia tragáveis nessa folha colorida, não resistiram à decomposição do nosso tempo. Que vontade eu tenho, hoje mesmo, de te encontrar andando, propositalmente acidental sorrindo e tropeçando pela rua. Logo eu, que pensei ter bebido o suficiente pra não mais sentir saudade de quem eu fui. Eu, que te cantei em vão e te reservei, em vão, um lugar só nosso. Ainda eu que te guardo no segundo andar do nosso café e te lavo nas lágrimas de todos os meus outros passados sem querer dizer: a cicatriz é permanente. E os teus cachos não me deixam mentir, e minha escrita não me deixa dizer, mas ainda dói. Dói e, enquanto eu não te esquecer e queimar as cartas que eu escondi no segundo andar de nós dois, temo que ainda irá doer.