quarta-feira, 8 de abril de 2015

Vertentes.

O processo criativo não é mais do que puramente mecânico e, como tal, necessita de combustível. O meu, como para muitos outros, é o sofrimento (ler Byron). Eu não necessariamente escrevo textos sofridos, mas é preciso, de certa forma, uma pequena dose de desilusão para que eu comece a funcionar. Sem ela, é como se minhas palavras fugissem de mim. Minha mente perde o foco e começa a viver a letargia da satisfação, e isso é fatal. Afinal, um indivíduo plenamente satisfeito é um indivíduo inútil (ler Nietzsche).
Mas até onde posso desbravar a dor? Me pergunto se sofrer é, pra mim, como a água é para a planta. Se for regada muito pouco, a planta seca e nada sobra dela senão os frutos que já foram colhidos. Se encharcada, as raízes apodrecem e sua essência morre por dentro. Mas como saber sem me doer até a putrificação? Como ter certeza sobre meus pensamentos e, mais importante, como elaborar uma tese sem ter que recorrer à auto-destruição? Eu poderia encontrar objetos de estudo que possuem a mesma singularidade que eu, mas me levaria anos e eu não tenho tanto tempo antes de sucumbir à tristeza - ou tenho?
Há também, além dessa, outras duas possibilidades. A primeira é de que a dor emocional é, para mim, como a insulina é para o diabético. É uma droga, mas é aquilo que mantém tudo em seu devido lugar. Se eu aumento a dose, meu corpo se acostuma e eu não mais posso voltar à dose anterior sem causar danos sérios ao meu emocional. Essa hipótese, além de inútil para estudo, é mais assustadora do que a primeira na medida que, com o tempo, minha tendência é sofrer sempre mais e escrever sempre menos, até acabar sozinho, triste e infértil. Eu seria desvalorizado como o homem que, após fazer-se de grandes feitos, começa a viver no eco do seu próprio passado, sendo sempre comparado à própria sombra; sombra tal que ele nunca conseguirá vencer.
A outra alternativa, porém, é menos traumatizante e me tira menos noites de sono, por isso deixei-a pro final. Minha esperança era de que eu conseguisse terminar o texto sem escrevê-la, por puro egoísmo: se eu não escrevo uma ideia, eu a guardo em mim, e se eu guardo em mim ela não se perde. Mas escrever se tornou um hábito, um vício, e me vejo agora na obrigação de escrever, com perigo de enlouquecer por falta de palavras e desaprender o mundo por falta de eloquência.
A terceira e mais promissora hipótese é de que o sofrer me habita. Não importando a situação, sempre existirá a dor, então sempre me existirão palavras. Talvez essa seja a possibilidade mais fácil de ser explicada, mas é também a mais rara. A dor seria como a fé, que existe no coração de poucos e independe do cotidiano. Para alguns, ela iria e voltaria quando quisesse, mas para outros seria permanente. Como a música foi em Ludwig Van, que continuou a tocar depois que seus ouvidos desistiram de ouvir, a infelicidade não me abandonaria tão cedo, mas isso também não me favorece. Se tudo que eu sou é dor, mas tudo que eu quero é bem, estou destinado à insatisfação. Eu viveria buscando uma felicidade que não me pertence pelo resto dessa vida hipotética. Ou, ainda nesse caso, talvez a insatisfação fosse aquilo que move o mundo, o combustível dos que realizam e dos que contam grandes feitos.

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